Em média, Sergipe registra mais de quatro casos de injúria racial por mês
Os dados são da Coordenadoria de Estatística e Análise Criminal (CEACrim) Cotidiano | Por Emerson Esteves e Victoria Costa 03/07/2023 17h49 |Com o objetivo de reforçar a necessidade da igualdade racial e respeito para o desenvolvimento da sociedade, o Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial é celebrado nesta segunda-feira, 3 de julho. A data faz alusão à Lei Afonso Arinos (n° 1.390/1951), primeiro código brasileiro contra preconceito de raça e cor da pele. Mesmo diante de vários anos de busca pela igualdade racial, os números de crimes praticados em razão de racismo ainda são altos e merecem alerta no Brasil.
Em Sergipe, conforme os dados da Coordenadoria de Estatística e Análise Criminal (CEACrim), de janeiro de 2022 a maio de 2023, foram registrados 83 casos de crimes que foram resultantes de preconceito de raça ou de cor, em geral tipificados como injúria racial. Os dados são referentes ao período após a entrada em vigor da Lei 14.532/2023, que equiparou a injúria ao crime de racismo.
Entre os crimes contabilizados este ano, um dos que mais repercutiu foi quando duas funcionárias de uma loja no Centro de Aracaju foram indiciadas pelo crime de racismo. A decisão da Delegacia Especial de Crimes Homofóbicos, Raciais e de Intolerância (DEACHRI) foi feita em reunião no Ministério Público de Sergipe (MPSE), conforme noticiou o F5 News.
Em outra situação, no dia 4 de junho, na Arena Batistão, um torcedor do Confiança denunciou ter sido vítima de racismo no estádio em Aracaju. A Polícia Militar foi acionada, e os envolvidos encaminhados ao Departamento de Atendimento a Grupos Vulneráveis (DAGV), que instaurou procedimento para apurar o caso.
Segundo as informações policiais, a vítima relatou que se aproximou da saída de um vestiário para criticar a atuação de um juiz. Os seguranças intervieram. Em uma breve discussão, um segurança teria cometido injúria racial contra o torcedor, chamando-o de "preto safado".
Com a nova legislação, de 11 de janeiro de 2023, injuriar alguém, com a ofensa à dignidade ou ao decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional, é passível da aplicação de pena de reclusão de dois a cinco anos e multa. Em casos da prática desse crime ocorrer no contexto de eventos esportivos, culturais e religiosos, há ainda a proibição de frequentar os locais por três anos.
Nesse sentido, a delegada Meire Mansuet ressaltou que não basta apenas se dizer que é contra o racismo e a injúria racial. “As pessoas precisam ter atitudes, ou seja, é preciso dar espaço e voz. Dizer que não é racista não resolve. É preciso denunciar o crime de racismo, o crime de injúria racial. Não se deve aceitar que a pessoa seja diminuída, menosprezada e ofendida pela cor da pele”, ressaltou.
Por isso, é preciso denunciar os casos de racismo e de injúria racial, conforme Meire Mansuet. “Infelizmente nós temos visto muito a prática de racismo e injúria racial. A Polícia Civil está aí para enfrentar, coibir e combater essa prática que é tão nefasta na nossa sociedade. Primeiro precisamos reconhecer que o Brasil é racista, e precisamos enfrentar esse racismo que se perpetua na história do país”, afirmou.
Casos notórios de injúria racial
No dia 3 de abril deste ano, o jornalista sergipano Evenilson Santana, mais conhecido como Mike Tyson, publicou em suas redes sociais que a Polícia Civil de Pernambuco indiciou por injúria racial a mulher que chamou o comunicador de macaco em 2021. Ela foi indiciada na última quinta-feira (30).
Evenilson sofreu injúria racial quando apresentava um programa em Recife (PE), porém a Polícia comprovou que a agressão veio de uma pessoa residente em Arapiraca (AL). No comentário a mulher diz: “ma ca co”, com sílabas separadas, mas ainda assim foi possível reconhecer o crime e, posteriormente, a responsável.
Em janeiro de 2017, a cantora Ludmilla também foi vítima do mesmo crime. Durante o Balanço Geral do Distrito Federal, o apresentador Marcão do Povo usou o termo “macaca” para se referir à cantora. Na ocasião, o jornalista falava sobre uma notícia de que ela teria evitado posar para fotos com os fãs. O caso veio a público novamente em 2021 após a cantora perder o processo por injúria racial.
“É uma coisa que não dá para entender. Era pobre e macaca, pobre, mas pobre mesmo. Sempre falo, eu era pobre e macaco também”, disparou Marcão.
Na ocasião, o apresentador chegou a ser demitido da Record TV, mas logo foi contratado pelo SBT. Em seu pedido de desculpas, Marcão alegou que o termo seria uma “expressão regional”.
No dia 22 passado, o apresentador Marcão do Povo foi condenado, de forma unânime, pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) pelo crime de racismo praticado contra Ludmilla. Os advogados da cantora recorreram da decisão anterior e venceram.
Afinal, qual a diferença entre racismo e injúria racial?
A delegada Meire Mansuet explica que há duas situações principais e distintas. “O racismo é a discriminação da pessoa pela cor da sua pele. O preconceito ou até mesmo os termos usados contra a coletividade de pessoas configuram crime de racismo. A injúria racial são os termos usados para diminuir e para ofender a pessoa por sua cor da pele”, ressaltou.
Como denunciar
As vítimas podem procurar o Departamento de Atendimento aos Grupos Vulneráveis (DAGV) e registrar a ocorrência. A unidade especializada da Polícia Civil funciona 24 horas e fica localizada na rua Itabaiana, 258, no bairro São José. Os casos de flagrante podem ser direcionados ao 190, da Polícia Militar, e crimes recorrentes podem ser denunciados pelo Disque-Denúncia (181). O telefone do DAGV é o (79) 3205-9400.
Conforme Meire Mansuet, o crime de racismo pode resultar em pena de até cinco anos de reclusão, inclusive os que são praticados através das redes sociais.
Assim que o crime ocorre, as vítimas e as pessoas ao redor podem acionar a Polícia Militar, por meio do telefone 190. “No caso de o crime ter acontecido naquele mesmo dia, o autor é autuado em flagrante delito pela prática tanto do racismo quanto da injúria racial. Inclusive são crimes inafiançáveis. As vítimas são acolhidas, ouvidas e, em termos de declarações, ouvimos as testemunhas. Assim é feito o procedimento policial para encaminhamento ao Poder Judiciário”, informou a delegada.
