"Fiz porque Glória fez": jornalistas negras contam como repórter foi inspiração | F5 News - Sergipe Atualizado

Luto
"Fiz porque Glória fez": jornalistas negras contam como repórter foi inspiração
Um dos maiores nomes do telejornalismo, Glória Maria morreu nesta quinta (2)
Brasil e Mundo | Por Victoria Costa e Emerson Esteves 02/02/2023 14h54 |


Na primeira transmissão em cores do Jornal Nacional, os brasileiros que ligaram a TV viram a pele negra de Glória Maria. O impacto desse acontecimento reverbera até hoje, quase 50 anos depois.

Sinônimo de talento e representatividade: essa foi Glória Maria. Desde a década de 70, quando começou na televisão, suas aparições representavam muito mais do que uma imagem: cada vez que ela surgia na tela, durante os quase cinquenta anos de carreira, mulheres e meninas negras se enxergavam nela.

Nesta quinta-feira (2), o Brasil se despediu da jornalista. A repórter fez história ao ser a primeira mulher negra a entrar ao vivo no Jornal Nacional e ao viajar a mais de 160 países para gravar reportagens, que viraram marca registrada da sua longa e consolidada carreira.

As entrevistas com grandes personalidades também entraram para a história da televisão; nessas quase cinco décadas, ela conversou com nomes como Freddie Mercury, Madonna e Michael Jackson.

A vaidade era outra forte característica da jornalista, que inclusive “escondia” a própria idade. Mas isso nem parecia importar diante da sua vasta experiência, como a de alguém que já viveu muitos anos, e, ao mesmo tempo, sua leveza, que remetia a uma eterna juventude.

Para tantas outras pessoas pretas, ver todo esse talento representado por uma mulher negra era como se enxergar no espelho e projetar que existia a esperança de ocupar aquele espaço.

Era esse sentimento que tomava conta do coração da jornalista Danyella Santana sempre que ela ligava a televisão e se deparava com a imagem de Glória exercendo a profissão que a jovem jornalista sonhava desde de criança, mas que, inicialmente, parecia ser algo distante.

“Logo quando eu decidi cursar Jornalismo, eu tinha muita dúvida se poderia fazer reportagem, por ser negra e ter cabelos cacheados. Eu sentia muito medo de não conseguir realizar esse meu sonho de criança, 'aparecer na televisão', mas a história da primeira repórter negra me fez repensar e acreditar mais no meu potencial, independentemente de cor” relatou em entrevista ao F5 News

O incentivo veio dentro de casa. Quando a mãe de Danyella via Glória na TV, acreditava que a filha poderia chegar tão longe quanto ela. “Com certeza, não só eu, como minha família também. Sempre assistíamos às reportagens de Glória na minha casa e minha mãe sempre me incentivou a seguir os passos dela, o amor pela reportagem”, relatou ao portal.

A trajetória da jornalista que conheceu o mundo, entrevistou famosos e inovou o telejornalismo, encantou tanto Danyella que virou tema do seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) durante a graduação. 

“Pesquisar sobre a trajetória de Glória Maria trouxe uma leveza para o meu TCC, principalmente [por] ser uma história inspiradora. O tema do meu trabalho foi "O racismo estrutural na televisão brasileira: uma análise da trajetória de Glória Maria". Achei vários materiais antigos (entrevistas e reportagens) que só me confirmaram o quanto a Gloriosa Glória foi forte durante todas as décadas em que trabalhou na Globo”, afirmou.

O trabalho foi feito em dupla com a jornalista Taynara Rodrigues, que também tem Glória Maria como uma inspiração. Ela contou ao F5 News que, a cada etapa do trabalho, se encantava mais com a carreira de Glória e com os passos dados pela jornalista, mesmo diante das dificuldades.

“Glória foi uma das primeiras jornalistas que comecei a acompanhar. Desde criança, adorava assistir às matérias especiais que fazia. O trabalho dela foi capaz de fazer eu me apaixonar pela profissão. Glória Maria tem um currículo impecável. Foi um prazer conhecer cada parte da história dela. Analisei matérias feitas por ela através das décadas e vi a evolução em cada matéria e cada conquista. Ver que ela, sendo mulher, negra e sem recursos financeiros no início da carreira, conseguiu entrevistas exclusivas e ser reconhecida e amada pelo trabalho, é muito motivador para quem está iniciando agora, como eu e muitas outras meninas” disse ao portal.

Outra mulher negra que vê Glória como um exemplo a ser seguido é Janiny Braz. Ainda estudante de jornalismo, a jovem já tem experiência como apresentadora e repórter de TV, e afirmou ao F5 News que a essência da jornalista é uma das qualidades que mais a inspira.

“Glória Maria já estava presente na minha infância nos programas dominicais. Eu fiquei feliz quando escolhi ser jornalista [...] É um espaço que foi muito mudado e que teve o papel importantíssimo de Glória Maria. Uma das coisas que eu vou levar dela como um ensinamento é a sua essência, nítida nos seus trabalhos, e é muito difícil, como a mulher negra, colocar a sua essência, ser quem você é e quem você escolheu ser”, declarou.

Para Janiny, Glória era uma referência que ia além do profissional. "A gente sabe do desafio, e é isso que eu vou carregar. Além de inúmeras referências como mãe, como mulher, como mulher negra, como pessoa, a forma de levar a vida, como ela sempre levou. Glória foi referência, resistência, orgulho e vai ser sempre assim”, completou a estudante.

“Eu sou porque nós somos”
Outra admiradora de Glória Maria como profissional e como pessoa é a jornalista socorrense Louise Wine, de 24 anos. Para ela, a trajetória de Glória mostrou que havia diversas possibilidades dentro da profissão.

“Se hoje eu seguro um microfone e exerço a minha profissão foi porque ela sempre esteve na minha TV. Uma presença que dizia que era possível e desbravava o mundo. Gosto daquela frase 'eu sou porque nós somos', mas Glória merece ainda outros verbos. Eu fiz porque Glória fez. Eu escrevi porque Glória escreveu. Eu sonhei porque Glória sonhou. Penso que, se eu conseguir tocar uma criança preta com meu trabalho, como Glória fez com tantos pequenos durante sua jornada, me sinto de dever cumprido”, afirmou em entrevista ao F5 News

A jornalista foi a primeira a escrever nas páginas da história das mulheres negras no jornalismo. Hoje, graças a ela, essa história pode continuar sendo escrita por mais Glórias, Danyellas, Taynaras, Janinys, Louises e tantas outras jornalistas negras espalhadas por todo o país. 
 

Edição de texto: Ana Luisa
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