Educação pode reduzir uso de cigarro eletrônico entre jovens, diz estudo
Em pesquisa com mais de 5 mil estudantes na Austrália, aulas sobre riscos do “vape” e estratégias de recusa reduziram em 65% a probabilidade de adesão ao produto Cotidiano | Por Metrópoles 09/10/2025 13h15 |Um programa educacional desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Sydney, na Austrália, reduziu a probabilidade de uso de cigarro eletrônico entre adolescentes em comparação com aulas convencionais sobre saúde. O resultado foi divulgado em estudo publicado em agosto na revista The Lancet Public Health e reforça o papel central da informação na prevenção ao uso dos chamados vapes, cada vez mais populares entre jovens não fumantes.
A iniciativa, criada pelo Centro Matilda de Pesquisa em Saúde Mental e Uso de Substâncias da universidade, foi testada com 5.157 estudantes de 12 a 14 anos de 40 escolas australianas. Eles foram divididos em dois grupos: um participou do programa de intervenção e o outro seguiu com o currículo tradicional.
No grupo de intervenção, 2.449 alunos assistiram a quatro aulas de 40 minutos sobre cigarros eletrônicos e tabaco, ministradas semanalmente. O conteúdo abordava a prevalência do uso, os danos ao organismo — como doenças respiratórias, cardiovasculares, prejuízos à saúde mental e risco de câncer —, além de ensinar estratégias de recusa e formas de buscar ajuda. Cada encontro incluía um desenho animado sobre o tema, materiais informativos e atividades em sala, como questionários e discussões.
O grupo controle, com 2.708 jovens, continuou recebendo aulas semanais de saúde previstas no currículo obrigatório. A eficácia do programa foi medida por meio de questionários aplicados ao longo de três anos — imediatamente após a intervenção, cinco semanas depois e em intervalos de seis, 12, 24 e 36 meses.
O impacto mais expressivo foi observado um ano após a participação, com uma redução de 65% na probabilidade de uso de cigarros eletrônicos entre os alunos do programa, em comparação com o grupo controle. Além disso, o projeto recebeu ampla aprovação dos participantes: mais de 80% dos estudantes afirmaram que as informações e habilidades aprendidas os ajudariam no futuro, e quase 90% dos professores avaliaram a iniciativa de forma positiva.
Estratégia positiva
Para a neuropsicóloga Ana Lucia Karasin, do Einstein Hospital Israelita, essas propostas ajudam o jovem não apenas a refletir antes de experimentar, mas também a se sentir mais preparado para resistir à pressão social. O adolescente entende os riscos e consegue dizer “não” com mais segurança quando é exposto a essas situações, pois já tem argumentos internos que dão suporte a sua escolha.
“Quando ele compreende que não se trata apenas de uma moda ou de algo passageiro, mas sim de uma prática que pode gerar dependência, prejudicar o funcionamento cerebral e abrir portas para outras dependências, ele passa a olhar para o cigarro eletrônico de outra forma”, afirma.
A proposta de um programa que alia informações de qualidade com atividades interativas é vista com bons olhos por especialistas. “Mais do que alertar sobre os malefícios, é fundamental proporcionar vivências que ensinem na prática estratégias eficazes para resistir às pressões sociais cotidianas”, diz a especialista do Einstein.
Muitos adolescentes começam a usar o cigarro eletrônico movidos pela curiosidade, pela influência de amigos ou pela ideia de que é algo inofensivo ou mais seguro do que o cigarro comum. “Quando recebem dados claros sobre os riscos, entendem que existe dependência química, que o cérebro ainda em desenvolvimento pode ser afetado e que há consequências reais para a saúde, então, a forma de pensar muda”, observa a psicóloga clínica Giovana Diez, especializada no atendimento de crianças e adolescentes, de São Paulo.
A adolescência é um período de grandes transformações, em que o jovem busca identidade, pertencimento e aceitação social. Daí porque, nessa fase, ficam mais vulneráveis a influências externas. “A informação possibilita consciência acerca de riscos, danos e prejuízos, mas sozinha é incapaz de alterar comportamento, principalmente de crianças e adolescentes, que estão em franco desenvolvimento emocional”, destaca a neuropsicóloga Natália Chequer Reis Junonski, especialista em dependência química pelo Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa (INESP).
O ideal é que programas de prevenção não apenas informem sobre riscos, mas também promovam o desenvolvimento da autoestima, do pensamento crítico e de habilidades socioemocionais. “Quando damos ferramentas para que eles se sintam confiantes, saibam lidar com frustrações e pressões e encontrar alternativas saudáveis de se expressar, aumenta a chance dizerem ‘não’ a comportamentos de risco”, afirma Giovana Diez. Campanhas de conscientização em redes sociais e meios de comunicação também são eficazes, pois alcançam os jovens onde eles realmente estão.
O papel dos pais e responsáveis é tão essencial quanto o da escola no combate ao uso de cigarros eletrônicos entre adolescentes. O diálogo dentro de casa e o apoio emocional são peças-chave nesse processo e complementam as informações recebidas em sala de aula. Quando a dependência já está instalada, é indispensável o acesso a tratamento especializado, o que inclui suporte médico e psicológico.





