Inácio Barbosa e os motivos da mudança da capital, 1855.
Historiador Amâncio Cardoso comenta os fatores econômicos, geopolíticos e fiscais Cotidiano 17/03/2024 09h30 |Por Amâncio Cardoso (historiador e professor aposentado do IFS).
Quais foram os motivos da mudança da capital de São Cristóvão para Aracaju em 17 de março de 1855?
Muitas especulações foram feitas ao longo dos anos. Já se especulou, por exemplo, entre historiadores, que a mudança foi realizada para atender aos interesses políticos e econômicos do Barão de Maruim, João Gomes de Melo (1809-1890), rico proprietário de engenho e terras; além de líder político do partido conservador na região da Cotinguiba.
Entretanto, independente da natureza de quaisquer motivações, apresentaremos aqui as razões alegadas pelo então presidente da província Inácio Joaquim Barbosa (1823-1855), fundador da nova capital.
As motivações do presidente para empreender a transferência foram oficialmente expostas à Assembleia Legislativa Provincial em um Relatório de 1º de março de
Vamos, então, às razões relatadas pelo fundador de Aracaju para realizar a transferência da capital da província.
A primeira razão diz respeito à localização inadequada de São Cristóvão. Essa inadequação se refere à posição da velha capital no “fundo do rio Paramopama”. Este ribeirão era raso e estreito para navegação e comércio, mesmo desaguando no Vaza-barris que se comunicava apenas com Itaporanga, mas não com as vilas e cidades economicamente expressivas (Laranjeiras, Maruim ou Estância). Isto explicaria, segundo Inácio, a estagnação econômica secular da velha São Cristóvão.
Aliada à primeira, a segunda razão referia-se ao uso de reboque a vapor para facilitar a entrada e a saída de navios de maior calado e, consequentemente, aumentar o fluxo de mercadorias produzidas pela lavoura, sobretudo o açúcar. E isto, acentua Inácio, só seria possível se a capital fosse mudada para a Barra da Cotinguiba (atual barra do rio Sergipe). Sendo assim, era impossível fazer a “praticagem” de reboque a vapor no riacho Paramopama.
Aliás, o presidente Inácio Barbosa já havia encomendado da Inglaterra um vapor para reboque, após incorporar uma companhia de navegação como esteio para uma possível mudança de porto e de capital.
Seguindo esta lógica, o presidente propõe aos deputados que a área mais propícia para a nova capital seria às margens do rio Sergipe no povoado Santo Antônio do Aracaju, na barra do rio Sergipe. Pois aí funcionaria como passagem fluvial para todo o vale do Cotinguiba. À época, essa região era a mais populosa e economicamente mais próspera, na qual se destacavam as cidades de Laranjeiras, Maruim e Santo Amaro. A foz do Sergipe seria, assim, uma espécie de portal por onde passariam “2/3 da soma total da exportação e importação da província”, argumenta Inácio.
Outra razão alegada pelo fundador da nossa capital foi a ligação entre Aracaju e Japaratuba, “importante e rica” região produtora de açúcar, conforme o presidente. Ele referia-se na verdade ao então recém construído canal do Pomonga, ligando os rios Japaratuba e Sergipe. Este empreendimento, acreditava Inácio, tornaria Aracaju “o lugar de maior futuro da província”.
Por fim, o presidente apresentou aos deputados uma última razão para mudar a capital: a presença de repartições fiscais na Barra da Cotinguiba, em Aracaju. Tais repartições eram a Mesa de Rendas (cobrava tributos provinciais) e a Alfândega (cobrava tributos gerais), arrecadavam “mais de dois terços da receita provincial”, alegou o presidente aos deputados. Neste sentido, a capital vindo para as praias do Aracaju garantiria uma melhor fiscalização dos impostos e menor sonegação fiscal, com isso esperava-se uma maior prosperidade da província, previu Inácio Barbosa.
Assim, vimos que o jovem administrador apresentou razões geopolítica, econômica e fiscal para fundamentar sua proposta de mudança da capital de Sergipe à Assembleia Provincial. Os deputados então aprovaram por ampla maioria (17 a 2) a transferência da capital. Com isso, Inácio sancionou a aprovação dos deputados através da Resolução nº 413, de 17 de março de 1855.
É por conta deste ato que os aracajuanos devem sua permanência na então inóspita e insalubre povoação de Santo Antônio do Aracaju, nova capital do estado.
Atualmente, Aracaju é uma das capitais mais atraentes do país, apesar de seus problemas urbanísticos e dos conflitos socioambientais, promovidos pela má reestruturação do território pela especulação do capital imobiliário, devido à ausência de um Plano Diretor Urbano Metropolitano.
Referências:
BARBOSA, Inácio Joaquim. Relatório apresentado à Assembleia Legislativa Provincial. Sergipe: Typographia Provincial, 01 de março de 1855. 32 p.
FRANÇA, Sarah Lúcia Alves. Capital imobiliário na reestruturação metropolitana e conflitos socioambientais. Disponível em: https://www.jlpolitica.com.br/. Acesso em: 02 de março de 2024.





